Quando regresso, faço-o com a fúria de quem nunca lá esteve.Gosto de chegar sozinha e ao entrar na aldeia desligar o rádio que me acompanhou durante a viagem.Abro o vidro e mesmo sem dar conta já estou a fazer o primeiro aceno.Começo inevitavelmente a sentir-me em casa.
Gosto de lembrar.Gosto de conseguir retirar da nostalgia quase tanto riso como do presente e talvez por isso só aqui esteja completa.É nessa nostalgia que encontro o segredo para partir sem nunca abandonar o Alentejo.
Levo sempre comigo a terra seca e o calor que gentilmente turva o pensamento, mas que sabe bem de tão puro. Levo o frio cortante do inverno e a chuva que só ali tem aquele cheiro.Levo o fumo da braseira e do forno de lenha.Levo o cantar ao som da rua daqueles que muitas vezes se deixam vencer plo vinho.
Levo as testas enrugadas e as peles queimadas de quem muito tem para contar.Levo a paciência para esperar o que nunca vai acontecer e levo a verdade de quem nunca aprendeu a ser de outra maneira. Levo a grandeza da planície e a imagem da azinheira,que tal como o poeta dizia, nunca saberá a idade.
Levo tudo o que posso quando parto, volto a trazer tudo quando regresso porque quem ama a terra não sabe roubar sem mais tarde devolver.Fecho o vidro, ligo o rádio e a única certeza é sempre a vontade de regressar.